UM ESTRANHO INCIDENTE

Felipe Attie
2 min readAug 19, 2023

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Acordei naquela manhã nublada com um misto de preguiça e pessimismo, pronto para enfrentar mais um dia dessa coisa estranha chamada “vida”. Como de costume, minha rotina matinal foi uma sequência de tropeções, derrubadas de objetos e xingamentos abafados. Mal sabia eu que algo fora do comum estava prestes a acontecer.

Enquanto tentava calçar minhas meias, percebi que o par estava incompleto. Sim, aquela típica batalha diária com a meia esquerda havia atingido seu auge. Eu revirei gavetas, procurei embaixo da cama, até mesmo questionei minha própria sanidade, mas não havia sinal da meia perdida.

Decidido a resolver esse enigma, vasculhei a casa em busca de pistas. Comecei pelos lugares mais óbvios, como o cesto de roupas sujas, onde camisetas se multiplicam como coelhos em um show de mágica. Nada. Decidi então revisitar as memórias dos meus últimos passos. Caminhei até o banheiro, acreditando que talvez a meia tivesse se refugiado no vaso sanitário, procurando por aventuras aquáticas. Mas, para minha decepção, nenhum sinal dela.

Cada canto da casa se transformou em uma paisagem digna de Sherlock Holmes. Vasculhei a geladeira, com a esperança de que talvez ela tivesse se disfarçado de resto de lasanha. Verifiquei até mesmo a garagem, onde encontrei tesouros perdidos de tempos passados, mas nenhuma meia para contar história.

Minha busca infindável me levou a lugares improváveis. Subi no telhado, imaginando se a meia havia adquirido asas e voado para um destino desconhecido. Passei horas no sótão, cercado por lembranças empoeiradas e enigmas não resolvidos. Por um momento, me perguntei se eu próprio era um personagem de uma fábula fantástica, em que objetos comuns ganham vida própria para testar nossa sanidade.

No final das contas, depois de uma busca hercúlea, tive que aceitar a derrota. A meia estava destinada a permanecer como um mistério não resolvido, uma lembrança mordaz da imperfeição do universo. Ela se tornou uma metáfora ambulante de todos os pequenos desaparecimentos que ocorrem em nossas vidas: chaves, canetas, meias e até mesmo nossos sonhos mais ousados.

Assim, caro leitor, encerro minha saga em busca da meia desaparecida. Se você, em algum momento, se deparar com uma meia solitária em seu caminho, saiba que ela pode ser uma chamada para a reflexão sobre as coisas que perdemos e histórias que deixamos para trás. Afinal, em meio a tropeços e desafios, as meias perdidas e as pequenas perdas da vida continuam a nos lembrar que nem tudo está destinado a ser encontrado e que, por vezes, é na busca que encontramos um pouco mais de nós mesmos.

Felipe Attie

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Felipe Attie

Escritor, redator e cartunista. Escrevo uns livros, rabisco uns quadrinhos e tento manter meu filho vivo.